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Um jeito de fazer TV

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As operações da Abril com a marca MTV no Brasil chegaram ao fim nesta semana, e na quinta-feira passada (26/09) aconteceu uma festa onde funcionários de todas as fases do canal apareceram para celebrar uma espécie de enterro mexicano da emissora abriliana. Fomos beber o morto que até já renasceu em outro canal.

A despedida aconteceu no prédio da Alfonso Bovero que também foi sede da antiga TV Tupi. A TV brasileira começou naquele endereço e não deixa de ser uma ironia o fato de que aquele também tenha sido palco da última tentativa de um grande grupo de comunicação brasileiro entrar no mercado de TV aberta no País. Não rola e isso sim talvez devesse ser objeto de análise e notícia no jornal. A MTV segue…

As transmissões começaram em 1990 e no início a fórmula parecia perfeita com a nova e revolucionária televisão inventada em NYC chegando pelas mãos dos herdeiros da maior editora de revistas do país.  A Abril ainda tinha as frequência UHF para alavancar o negócio nos modelos de uma TV aberta além de toda a estrutura corporativa e de vendas que os anos noventa permitiam.

Essa fase familiar durou aproximadamente oito anos e foi mais ou menos no final dessa época que fui contratado. Poucos meses depois de assumir o cargo de redator de promos aconteceram os primeiros cortes em cargos e custos de produção e o anúncio era claro: o canal deveria dar lucro ou seria fechado.

O clima triste e tenso quando sairam André Vaisman, Gastão e Fábio Massari parecia o fim do mundo de meu sonho adolescente e aqueles caras ERAM o canal desde o lançamento. É difícil entender a razão de cortar os melhores mas o capitalismo tem razões que a própria razão desconhece e talvez no final deste texto eu consiga explicar

MTV. Na sua língua.

A primeira missão da presidência de André Mantovani e das diretorias de programação e produção de Zico Goes e Cris Lobo era criar uma identidade mais brasileira para o canal e aumentar o playlist das músicas que as gravadoras estavam vendendo. Talvez hoje isso nem seja uma ideia difícil de entender mas quando a diretoria também avisou que o formato do videoclipe estava acabando, alguns jornalistas traduziram isso como se a MTV Brasil estivesse matando o videoclipe e nunca mais esse mal-estar seria superado plenamente pelo jornalismo sabichão.

No departamento de criação, chefiado por Jimmy Leroy na época, o desafio de criar uma identidade mais brasileira também significou falar mais de política, meio-ambiente, cidadania e circular mais pelo Brasil, aumentando radicalmente o volume de produção de promos e campanhas sociais que falassem com o jovem brasileiro

Foi foda isso!

Os programas passaram a ter formatos de TV aberta, com participação da audiência e entrevistas, e nos anos seguintes tanto o lucro quanto a audiência cresceram, e também as pesquisas mostraram que a MTV passou a ser vista como um canal mais brasileiro. Bingo!

Veio uma pequena fase de lucro e prosperidade e nessa trilha consegui escrever o Desligue a TV e vá Ler um Livro; Tome Conta do Brasil; Prepare o saco, os ovos e os tomates; Preservar o Planeta Começa em Casa; Pacto MTV; Voz MTV e uma infinidade de campanhas que, junto com alguns programas, transformaram o canal em referência na comunicação com a audiência jovem.

Cada um faz a sua MTV

Quando aconteceu a invasão do Iraque a mensagem era: A MTV Brasil não quer essa guerra!  Hoje isso pode parecer mais fácil mas não dentro de uma marca americana com sede em Nova York e apenas um ano depois do 11 de sentembro.

Foi aí, e com as campanhas de prevenção à AIDS, que comecei a ouvir de colegas da MTV Internacional que aquilo que produzíamos no Brasil era diferente e isso mudaria minha relação com o canal para sempre. Começamos a co-produzir com a America Latina e o Caribe sobre temas de sexualidade e cidadania, e Mantovani e Zico foram os caras que incentivaram e deram total liberdade para fazermos essa MTV mais punk e politizada de todas. Recebemos prêmios e viajamos o mundo inteiro falando sobre o que fazíamos mas talvez por razões de mercado isso tenha sido pouco analisado no Brasil. Uma escola de talentos incríveis de produtores de promo e gráficos se formou ali numa situação que dificilmente se repetirá em outros canais pelo mundo. .

Saí em 2010 depois de 12 anos e estava achando estranha a ideia de uma festa de encerramento de algo que não vai exatamente acabar mas me surpreendi com o sorriso de quem foi feliz ali dentro e fez um final feliz e louco como só no Brasil isso pode acontecer. Fiz grandes amigos tanto na Abril quanto na Viacom e tenho a certeza de que o maior valor da marca MTV no Brasil é o próprio Brasil.

Aliás, tome conta do Brasil!

ps. Me avisa André Vaisman que sua saída do canal foi por decisão própria dentro do contexto narrado acima. Mesmo assim confesso que até hoje não entendo tamanha perda de talentos

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